A DOUTRINA DE CRISTO
“Todo aquele que transgride,
e não permanece na doutrina
de Cristo, não tem a Deus.
Quem permanece na
doutrina de Cristo, esse tem
tanto ao Pai como ao Filho.”
2 João 9

Nossa doutrina, assim como a de qualquer outro cristão, deve ser a doutrina de Cristo. Mas, qual é essa doutrina? Antes de respondermos a essa importante questão, convém ressaltar que a doutrina de Cristo nada tem a ver com tradições religiosas, regimentos internos de denominações cristãs, ou complexas elaborações teológicas.1 Em vez disso, a doutrina de Cristo diz respeito, exclusivamente, ao que ele mesmo nos ensinou — pois doutrina é uma palavra que significa exatamente isto: "ensinamento". Logo, a doutrina de Cristo se trata simplesmente daquilo que Jesus nos ensinou, sem qualquer omissão ou acréscimo.

Mas, o que Jesus Cristo nos ensinou? Seria de se esperar que tal pergunta fosse respondida com uma lista dos seus ensinamentos, porém fazer isso seria um equívoco, pois o evangelho, como veremos, não se trata desse tipo de elaboração.2 Sendo assim, devemos reformular a pergunta, pois a questão principal não é o que ele nos ensinou, mas principalmente sobre o que ele nos ensinou. E, nesse sentindo, toda a sua doutrina concentra-se num único assunto: o reino de Deus.

“E, depois que João foi entregue à prisão, veio Jesus para a Galileia, pregando o evangelho do reino de Deus, E dizendo: O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo. Arrependei-vos, e crede no evangelho.”
(Marcos 1:14,15)

No entanto, o "reino de Deus" a respeito do qual Jesus nos ensinou, não deve ser entendido como sendo algo geográfico, delimitado por fronteiras físicas. Embora saibamos que após a vinda de Cristo todos os salvos hão de herdar o seu reino, necessitamos compreender que a fé em Cristo nos possibilita fazermos parte desse reinado de Deus aqui e agora. Isso ocorre porque o termo "reino" no Novo Testamento, tradução do grego "basileia", refere-se não necessariamente ao território de um rei, mas a um reinado efetivo, ou seja, a quem está submetido a determinado governo, onde quer que essa pessoa se encontre. Tal era o entendimento no mundo antigo, onde não somente no idioma grego, mas também no hebraico e aramaico, o sentido de “reino” era abstrato.3 Logo, Jesus ensinava sobre o reinado de Deus, ou seja, sobre sermos diretamente governados por Deus, assim como ele mesmo nos deu exemplo, sendo completamente submisso ao Pai.

Posteriormente, após a ressurreição do Senhor, coube aos apóstolos a tarefa de ensinar abertamente que o reino de Deus se compõe daqueles que recebem o Espírito Santo, sendo então governados por ele, e não mais pela natureza carnal. Por esse motivo, a expressão “reino de Deus” foi dando espaço, tanto nas epístolas quanto no livro de Atos dos Apóstolos, a ensinamentos sobre sermos cheios do Espírito Santo e guiados por ele.4 O próprio Senhor Jesus não ensinou tão abertamente a esse respeito, pois não poderíamos receber o Espírito Santo antes da sua glorificação, ou seja, da sua morte na cruz para fazer a expiação dos pecados e da sua ressurreição para a justificação de todo aquele que nele crê.

“E no último dia, o grande dia da festa, Jesus pôs-se em pé, e clamou, dizendo: Se alguém tem sede, venha a mim, e beba. Quem crê em mim, como diz a Escritura, rios de água viva correrão do seu ventre. E isto disse ele do Espírito que haviam de receber os que nele cressem; porque o Espírito Santo ainda não fora dado, por ainda Jesus não ter sido glorificado.”
(João 7:37-39)

Tal esclarecimento é importantíssimo, pois toda a doutrina de Cristo — como, por exemplo, os ensinamentos do sermão do monte, em Mateus 5-7 — não podem ser praticados com sinceridade senão por aqueles que recebem o Espírito Santo pela fé. A tentativa de seguir o que Jesus nos ensinou com a própria força carnal resultará em fracasso e hipocrisia. Faz-se necessário ocorrer o que o próprio Senhor chamou de "nascer de novo", pois "aquele que não nascer de novo não pode ver o reino de Deus." (João 3:3) Desta forma, não podemos separar a pessoa de Cristo dos seus ensinamentos, pois ele é quem nos capacita, por meio do Espírito Santo, a andarmos em novidade de vida, sendo guiados na prática da sua doutrina.

Este "nascer de novo" é o resultado de nos unirmos a Cristo pela fé nele.5 Sua morte e ressurreição não ocorreram apenas para que tenhamos salvação no porvir, mas para que sejamos cheios do Espírito Santo agora mesmo, a fim de sermos transformados interiormente, de dentro para fora, sem qualquer hipocrisia. Sendo assim, ainda que façamos uma lista do que o Senhor Jesus nos ensinou, importa compreendermos que tais ensinamentos serão seguidos naturalmente (talvez seja melhor dizer: sobrenaturalmente) por aqueles que tiverem nascido de novo pela fé em Cristo — assim como a frutificação é o resultado natural de um ramo que faz parte de uma boa árvore frutífera. O próprio Senhor Jesus nos deixou essa ilustração, onde ele revelou a si mesmo como sendo a videira verdadeira, nós os ramos que devemos estar ligados a ele, e a sua palavra, ou ensinamentos, como o modo pelo qual o Pai nos limpa para que possamos dar cada vez mais frutos para a sua glória. (Confira: João 15:1-8). Logo, conhecermos a doutrina de Cristo e desejarmos cumpri-la é muito importante, porém não podemos nos esquecer que é pelo poder do seu Espírito Santo que conseguiremos andar no caminho que ele nos ensinou.6

"Nisto é glorificado meu Pai, que deis muito fruto; e assim sereis meus discípulos."
(João 15:8)

Muito mais poderia ser dito aqui a respeito da doutrina de Cristo, porém isso é desnecessário, uma vez que sua doutrina já está plenamente revelada nos escritos do Novo Testamento.7 Porém, a leitura da Bíblia não deve ser um fim em si mesmo. O propósito das Escrituras é nos conduzir a Jesus Cristo — único mediador entre Deus e os homens — não apenas para que o conheçamos, mas para que o amemos, e assim sejamos realmente convertidos, dando muito bom fruto para a glória de Deus. Por isso ele mesmo advertiu aos judeus que conheciam as Escrituras, mas ainda não o seguiam:

"Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim. Contudo, não quereis vir a mim para terdes vida."
(João 5:39,40)

Temos ido a Cristo? Ora, conhecer a sua doutrina através da leitura meditativa do Novo Testamento é importantíssimo, mas não é um fim em si mesmo. É preciso seguirmos até o Senhor em oração para que nele sejamos vivificados, sendo cheios do Espírito Santo. Lembre-se: Jesus não somente nos deixou a sua doutrina, mas ofertou a si mesmo pela nossa salvação.

Sendo assim, não fique apenas examinando as Sagradas Escrituras, mas renda-se diariamente em oração ao seu único Autor, e de todo o seu coração. Reconheça que, por si mesmo, você jamais conseguirá seguir os seus ensinamentos. E então, sinceramente arrependido de todo pecado, peça ao Senhor para ser cheio do Espírito Santo, a fim de cada dia mais se parecer com o Senhor, dando muito bom fruto para a glória de Deus. Esse é o propósito da doutrina de Cristo: andarmos como ele andou, em santidade e justiça, amando a Deus sobre todas as coisas, e ao próximo como ele nos amou.

E, finalmente, para permanecermos na doutrina de Cristo é importante que tenhamos contato frequente com outros irmãos que também o amam, a fim de mutuamente nos fortalecermos na fé e nos estimularmos na prática de tudo quanto o Senhor nos ensinou. “Se andarmos na luz, como ele na luz está, temos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus Cristo, seu Filho, nos purifica de todo o pecado.” (1 João 1:7). Por esse motivo é que os apóstolos não somente pregavam o evangelho, mas também formavam congregações com os novos convertidos, ensinando que se edificassem mutuamente em Cristo e orassem uns pelos outros, a fim de serem sempre cheios do Espírito Santo e conseguissem guardar tudo quanto Cristo nos ordenou.

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Notas:

1. Complexas elaborações teológicas.
Não há aqui um desprezo ao estudo teológico. Apenas não podemos esquecer que seminários teológicos formam teólogos, mas não discípulos de Cristo. Não devemos confundir teologia com discipulado. É muito significativo que após Barnabé e Saulo terem ensinado ao longo de um ano na igreja de Antioquia, os discípulos dessa igreja não foram chamados de teólogos, mas de cristãos. Confira Atos 11:26. Certamente foram assim chamados porque o proceder deles se parecia com o de Cristo, e não com o de doutores em divindade. Isso comprova que Barnabé e Saulo ensinavam a doutrina de Cristo, e não teologia cristã. Ainda que estudar teologia possa trazer algum benefício intelectual ao aluno, devemos lembrar que a missão deixada para nós pelo Senhor é que sejamos seus discípulos, aprendendo a andarmos como ele andou. Para isso não necessitamos de livros e cursos teológicos, mas apenas crermos na revelação divina contida nas Escrituras. Cursos teológicos geralmente vão além do ensino de Cristo e dos apóstolos, acrescentando à simplicidade do evangelho uma série de questões ideológicas ou filosóficas desnecessárias para um sadio crescimento espiritual. Tais estudos acabam sendo uma distração, consumindo o tempo que melhor seria investido na simples meditação bíblica, da qual obtemos verdadeiro proveito prático. Acerca disso, Paulo advertiu numa de suas epístolas: “Mas temo que, assim como a serpente enganou Eva com a sua astúcia, assim também sejam de alguma sorte corrompidos os vossos sentidos, e se apartem da simplicidade que há em Cristo.” (2 Coríntios 11:3). Não é da vontade do nosso Pai que seus filhos estejam discutindo assuntos teológicos controversos, os quais, além de não terem utilidade prática, podem gerar discórdia e divisão entre os irmãos espiritualmente fracos. Que nos mantenhamos vigilantes, unidos em Cristo, mantendo o foco naquilo que é essencial, prático e claramente revelado na palavra de Deus. Acerca disso, confira atentamente os seguintes textos: Rm 16:17; Hb 13:9; 1Tm 1:3-7; 6:3-5; 2Tm 2:14-16,23-26; Tt 3:9-11; 2Jo 9,10.
2. Não se trata desse tipo de elaboração.
Afirmação de que seria um equívoco fazer uma lista com os ensinamentos de Cristo parece contradizer Mateus 28:20, onde o Senhor declara que devemos fazer discípulos "ensinando-os a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado". Notemos, no entanto, que o Senhor não disse para fazermos discípulos "ensinando-os todas as coisas que eu vos tenho mandado". Ele disse "ensinando-os a guardar..." ou seja, devemos ensinar como se consegue obedecer, e não simplesmente ordenarmos que Cristo seja obedecido. Sendo assim, como guardar o que o Senhor nos ensinou? A resposta é o novo nascimento que experimentamos pela fé em Cristo — momento a partir do qual passamos a ser guiados pelo Espírito Santo, desejando agradar ao Senhor em tudo, o que significa obedecê-lo por amor, e não por obrigação ou medo.
3. O sentido de reino era abstrato.
Apesar de reino aparecer em quase todas as versões do Novo Testamento em português, os eruditos em grego antigo são unânimes em afirmar que o termo basileia teria sido melhor traduzido como reinado, pois tinha o sentido de soberania, governo, ou senhorio. Quem não é governado por Deus, mas se rebela contra a sua vontade, não faz parte do reino de Deus. “Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus.” (Romanos 8:14). "O reino de Deus não vem com aparência exterior. Nem dirão: Ei-lo aqui, ou: Ei-lo ali; porque eis que o reino de Deus está dentro de vós." (Lucas 17:20,21).
4. Sermos cheios do Espírito Santo e guiados por ele.
O Evangelho Segundo João faz uma perfeita transição entre os evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas, nos quais o reino de Deus é mais enfatizado, e o restante do Novo Testamento, onde há maior ênfase na atuação do Espírito Santo. Em João, a expressão “reino de Deus” é diretamente mencionada desta maneira apenas no capítulo três, havendo posteriormente mais enfoque no agir do Espírito, especialmente a partir do capítulo 14. Convém explicar que a expressão “reino dos céus” adotada por Mateus na maioria das passagens, não se trata de um reino diferente, mas de outra forma de se referir ao reino de Deus.
5. Nos unirmos a Cristo pela fé nele.
O sentido bíblico de fé não é somente de uma crença, mas também de uma adesão. Crer em Cristo não é apenas acreditar que ele existiu, ou que é o Salvador, mas também unir-se a ele para ser cheio do Espírito Santo a fim de que se possa obedecê-lo como Senhor. Uma das melhores explicações a esse respeito nos foi dada por ilustração em João 15, onde o próprio Senhor declarou: "Eu sou a videira, vós os ramos; quem está em mim, e eu nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer." (João 15:5)
6. Andar no caminho que ele nos ensinou.
Sabemos que a salvação é unicamente pela graça de Deus por meio da fé em Jesus Cristo. No entanto, um verdadeiro convertido a Cristo não continuará na prática do pecado, mas buscará encher-se do Espírito Santo para andar em novidade de vida, dando bons frutos para a glória de Deus. Do contrário, não houve genuína conversão. Há diversas passagens bíblicas que nos revelam essa verdade, tais como: At 2:42-47; 26:20; Rm 12:9-21; 1Co 6:9-20; 13;1-8; 16:13-14; 2Co 9:8; Gl 5:6,19-26; 6:1-10,15; Ef 1:4; 2:10; 4:1,17-32; 5:1-33;6:1-9; 24; Fp 1:9-11,27-30; 2:1-16; 4:9; Cl 1:10; 3:1-25; 4:1-6; 1Ts 3:12,13; 4:1-12; 1Tm 6:3-11,17-19; 2Tm 2:22; 3:10; Tt 2:1-14; 3:8,14; Hb 12:4,12-16,28,29; 13:1-5,21; Tg 1:21,22,26,27; 2:13-26; 1Pe 1:13-25; 2:1-5,11-25; 3:1-17; 4:1-11,19; 2Pe 1:5-11; 3:11-14; 1Jo 2:6; 3:6-9; 2Jo 5,6; Jd 20-25; Ap 2:5,16,22;3:3,19.
7. Através da leitura do Novo Testamento.
Isso não significa, no entanto, que as escrituras do Velho Testamento não sejam importantes, pois o seu propósito principal é nos despertar para a necessidade da salvação em Cristo. Por esse motivo incentivamos a leitura e releitura de toda a Bíblia Sagrada, ano após ano, através do plano de leitura que elaboramos. Quem adquire o hábito da leitura bíblica diária, e de toda a Bíblia anualmente, conseguirá manejar bem a palavra da verdade, ao invés de conhecer apenas os textos da sua predileção.

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